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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS E AMBIENTAIS CURSO DE ENGENHARIA AMBIENTAL TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS DE BOVINOCULTURA DE LEITE NO BRASIL – SITUAÇÃO ATUAL E POSSIBILIDADES TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

Samara Terezinha Decezaro

Frederico Westphalen, RS, Brasil

TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS DE BOVINOCULTURA DE LEITE NO BRASIL – SITUAÇÃO ATUAL E POSSIBILIDADES

Samara Terezinha Decezaro

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Engenharia Ambiental da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como

requisito parcial para obtenção do grau de Engenheira Ambiental

Orientador: Dr. Raphael Corrêa Medeiros Co-orientador: Dr. Pablo Heleno Sezerino

Frederico Westphalen, RS, Brasil

2013

AGRADECIMENTOS

Primeiramente à Deus, por sempre iluminar meus passos. À minha família e ao meu noivo Giliarde Tavares da Silva, pelo incentivo, motivação

e apoio. Ao professor Dr. Raphael Corrêa Medeiros, pela valiosa orientação no desenvolvimento deste trabalho. Ao professor Dr. Pablo Heleno Sezerino, pela confiança depositada em mim na iniciação científica, pelos conselhos e pela amizade. À Catiane Pelissari, pelo companheirismo nos trabalhos a campo e laboratório. Aos acadêmicos do Curso de Engenharia Ambiental da UFSM, em especial ao Igor Bergmann, pela ajuda nos trabalhos a campo. Aos colegas do NUPEEA pela amizade. À todos os professores do Curso de Engenharia Ambiental, que de uma ou outra forma contribuíram para o desenvolvimento deste trabalho.

Muito obrigada!

Suba o primeiro degrau com fé. Não é necessário que você veja toda a escada. Apenas dê o primeiro passo.

(Martin Luther King)

RESUMO

Trabalho de Conclusão de Curso Curso de Engenharia Ambiental Universidade Federal de Santa Maria

TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS DE BOVINOCULTURA DE LEITE NO BRASIL – SITUAÇÃO ATUAL E POSSIBILIDADES

AUTORA: SAMARA TEREZINHA DECEZARO ORIENTADOR: RAPHAEL CORRÊA MEDEIROS Data e Local da Defesa: Frederico Westphalen, 16 de dezembro de 2013.

A bovinocultura de leite é uma atividade de reconhecida importância econômica no Brasil, contudo, responsável pela geração de grande volume de águas residuárias, que necessitam de tratamento adequado. Diante disso, o objetivo deste trabalho é apresentar alternativas para tratamento de efluentes de bovinocultura leiteira no Brasil, a partir de uma revisão de literatura a nível nacional e da avaliação de um sistema experimental composto por wetlands construídos, na região noroeste do Rio Grande do Sul. O levantamento das alternativas de tratamento já estudadas no Brasil consistiu na busca por textos científicos nacionais publicados a partir do ano 2000. Quanto ao sistema experimental, a metodologia consistiu na implantação, operação e monitoramento físico-químico (durante 1 ano) de dois wetlands, sendo

um de fluxo horizontal 2 – WCFH (26,5 m de área) e outro de fluxo vertical – WCFV (14,3 m 2

de área), plantados com Typha sp. Os resultados obtidos apontaram: Existem esforços no país para implantação de tecnologias de tratamento que apresentem baixos custos de implantação e operação, simplicidade operacional e que possam viabilizar o reuso do efluente tratado e/ou a produção de energia, sendo, de acordo com a revisão de literatura, os sistemas de lagoas e wetlands construídos os que apresentaram as menores concentrações efluentes de matéria orgânica e de nutrientes. A avaliação das unidades wetlands experimentais também demonstrou que este tipo de sistema, principalmente os WCFH, são uma tecnologia viável para tratamento de efluentes de bovinocultura leiteira, notadamente na Mesorregião Noroeste Rio-Grandense, com grande potencial de aplicação nas propriedades produtoras de leite do Brasil.

Palavras-chave: Sala de ordenha. Efluentes. Resíduos agroindustriais. Tratamento. Wetlands construídos.

ABSTRACT

The dairy cattle is an important economic activity recognized in Brazil, however, responsible for generating large volumes of wastewater that require proper treatment. Thus, the aim of this paper is to present alternatives for dairy parlors wastewater treatment in Brazil, from a national literature review and evaluation of an experimental system of constructed wetlands in the northwest region of Rio Grande do Sul. The treatment alternatives already studied in Brazil were searched in national scientific texts published since 2000. For the experimental system, the methodology was implementation, operation and physic-chemical monitoring (for 1 year) of two

wetlands: horizontal flow - WCFH (26.5 m 2 of area ) and vertical flow - WCFV (14.3 m 2 of area), both planted with Typha sp. The results showed: There are efforts in the country to implement treatment technologies that have low implementation and operation costs, operational simplicity, and to make possible the reuse of treated effluent and / or energy production. According to the review literature, stabilization ponds and constructed wetlands systems were those who had the lowest effluent concentrations of organic matter and nutrients. The evaluation of experimental wetlands units also showed that this kind of system, especially WCFH are a viable technology for treating dairy parlors wastewater, especially in northwest region of Rio Grande do Sul, with great application potential in the milk producing properties located in Brazil.

Keywords: Dairy parlors. Wastewater. Agroindustrial waste. Treatment. Constructed wetlands.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT

Associação Brasileira de Normas Técnicas

ANOVA

Análise de Variância

APHA

American Public Health Association

CAFW

Colégio Agrícola de Frederico Westphalen

CONSEMA

Conselho Estadual do Meio Ambiente CF Coliformes fecais

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CTC

Capacidade de troca catiônica

D 10 Diâmetro Efetivo

D 60 Diâmetro a 60 %

DBO o 5,20 Demanda Bioquímica de Oxigênio, 5 dias de incubação, a 20 C DN

Diâmetro Nominal

DP

Desvio Padrão

DQO

Demanda Química de Oxigênio

E. coli

Escherichia coli

EMBRAPA

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

ETE

Estação de Tratamento de Efluentes

IBGE

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

LD

Lagoa de Decantação

LMCC

Laboratório de Materiais de Construção Civil

NMP

Número Mais Provável

Norg

Nitrogênio Orgânico

NRCS

Natural Resources Conservation Service

NT

Nitrogênio Total

NTK

Nitrogênio Total Kjeldhal N-NH 4 Nitrogênio Amoniacal

N-NO -

2 Nitrogênio Nitrito

N-NO -

3 Nitrogênio Nitrato

NUPEEA Núcleo de Pesquisa e Extensão em Engenharia Ambiental OD

Oxigênio Dissolvido Oxigênio Dissolvido

Potencial Hidrogeniônico

P-PO 3-

4 Fósforo Ortofosfato

PVC

Polyvinyl chloride

SS

Sólidos Suspensos

SSD

Sólidos Sedimentáveis

ST

Sólidos Totais

STF

Sólidos Totais Fixos

STV

Sólidos Totais Voláteis

Temperatura

TDH

Tempo de Detenção Hidráulica

Coeficiente de Uniformidade

UASB

Upflow Anaerobic Sludge Blanket

UFSM

Universidade Federal de Santa Maria

WCFH

Wetland Construído de Fluxo Horizontal

WCFV

Wetland Construído de Fluxo Vertical

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A bovinocultura de leite é uma atividade de grande importância econômica no Brasil e apresenta-se em crescente expansão. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2011 foram produzidos no Brasil 32,096 bilhões

de litros de leite. Esta produção acarreta na geração de grande volume de águas residuárias que apresentam potencial para a poluição, de forma que a simples disposição dessas águas residuárias no solo sem tratamento adequado - prática muito utilizada quando se tem disponibilidade de área - pode causar grande impacto por sobrecarga

de nutrientes no solo, podendo até mesmo ocasionar a eutrofização dos cursos de água. Diversas propostas para tratamento de efluentes desse tipo são apresentadas em trabalhos publicados a nível internacional, destacando-se os trabalhos de Luostarinen e Rintala (2005), Dunne, et al. (2005), Gottschall, et al. (2007), Bolan, et al. (2009), Ruane, et al. (2011), Rico, García e Rico (2011) e Comino, Riggio e Rosso (2012), os quais citam as lagoas de estabilização, os biodigestores, os filtros aeróbios, os reatores UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket) e também os wetlands construídos como opções para tratamento de efluentes de bovinocultura de leite.

Os wetlands construídos destacam-se nesse contexto, como alternativa de simples operação e de baixo custo de implantação e de manutenção, comparados com tecnologias convencionais, sendo também atrativos para manter aspectos paisagísticos do meio rural. Newman, et al. (2000) empregando um sistema de wetlands no tratamento de efluentes de instalações de bovinocultura de leite encontraram eficiências médias de remoção de 94%, 85%, 68%, 60% e 53% para sólidos suspensos totais, DBO 5,20 , fósforo total, nitrato –nitrito e nitrogênio total Kjedahl, respectivamente. Crolla e Kinsley (2002) apud Gottschall, et al. (2007) também operaram, durante um período de quatro anos, wetlands para tratamento de efluentes de instalações de bovinocultura de leite e obtiveram eficiências médias de remoção de nitrogênio total Kjedahl e fósforo total iguais a 72% e 58%, respectivamente, em todo período de operação.

Contudo, pouco conhecimento se tem sobre as tecnologias já implantadas para tratamento de águas residuárias de bovinocultura de leite no Brasil e principalmente sobre as experiências bem sucedidas. Salienta-se que o tratamento dessas águas residuárias deve ser adequado à forma de produção, bem como a legislação ambiental vigente, o que pode variar entre as regiões produtoras de leite do país.

1.1 Objetivos

1.1.1 Objetivo geral

O principal objetivo deste trabalho é apresentar alternativas para tratamento

de efluentes de bovinocultura leiteira no Brasil, a partir de uma revisão de literatura a nível nacional e da avaliação de um sistema experimental composto por wetlands construídos, na região noroeste do Rio Grande do Sul.

1.1.2 Objetivos específicos

Como objetivos específicos do trabalho, destacam-se: (i)

Implantar, operar, monitorar e avaliar duas unidades de tratamento de efluentes do tipo wetlands construídos, uma de fluxo horizontal e outra

de fluxo vertical, implantadas em clima subtropical, região noroeste do Rio Grande do Sul; (ii)

Realizar uma revisão da literatura sobre as alternativas disponíveis para tratamento de águas residuárias de bovinocultura de leite no Brasil, com destaque para a aplicação de wetlands construídos para tratamento desses efluentes.

2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 Situação da atividade leiteira no Brasil

De acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o Brasil é um dos maiores produtores de leite do mundo, ocupando em 2010 o 5º lugar no ranking mundial. Os Estados Unidos lideram o ranking de países produtores, em sequência aparecem Índia, China e Rússia (EMBRAPA GADO DE LEITE, 2010).

No Brasil, a produção total de leite registrada pela Pesquisa da Pecuária Municipal do IBGE foi de 32,091 bilhões de litros em 2011. Deste total, segundo a Pesquisa Trimestral do Leite, realizada pelo IBGE, 67,9% foram adquiridos pela indústria de laticínios sob inspeção sanitária. O restante desta produção deve-se ao auto-consumo, produção artesanal de queijos e derivados, perdas, etc. (IBGE, 2011).

As condições edafoclimáticas do Brasil possibilitam a adaptação da atividade leiteira às peculiaridades regionais. Por essa razão, atualmente, a pecuária leiteira é praticada em todo território nacional e assim, existem diversos modelos ou formas

de produção de leite, com variados graus de especialização, incluindo desde propriedades de subsistência, as quais utilizam técnicas rudimentares, com produção diária inferior a 10 litros de leite até grandes propriedades produtoras que utilizam tecnologias avançadas, com produção diária superior a 50 mil litros de leite (ZOCCAL e GOMES, 2005).

Os dados da Pesquisa da Pecuária Municipal do IBGE (2011) mostram que a produção nacional de leite apresenta-se em crescente expansão, sendo que no comparativo entre 2010 e 2011 apresentou incremento de 4,5% (tabela 1 e figura 1). Minas Gerais é o estado brasileiro que mais se destaca na produção de leite, com participação de 27,3%, seguido por Rio Grande do Sul (12,1%), Paraná (11,9%) e Goiás (10,9%). Estes estados concentram 62,1% de todo o leite produzido no País. Os três municípios maiores produtores de leite no Brasil, em 2011, foram Castro (PR), Patos de Minas (MG) e Jataí (GO).

Tabela 1 - Efetivo de vacas ordenhadas e produção de leite, total e variação percentual, segundo as Unidades da Federação - 2010-2011.

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Agropecuária, Pesquisa da Pecuária Municipal 2010-2011.

Figura 1 – Estados brasileiros com as maiores produções de leite, em 2011.

Fonte: Elaborado a partir de dados do IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Agropecuária, Pesquisa da Pecuária Municipal 2010-2011.

Quanto a dados de produtividade, segundo o IBGE (2011), a maior produtividade nacional de leite foi alcançada pelo Estado do Rio Grande do Sul (2.536 litros/vaca/ano), seguido por Santa Catarina (2.478 litros/vaca/ano) e Paraná (2.404 litros/vaca/ano). Minas Gerais, embora seja o maior produtor nacional de leite

de vaca, ocupa a quarta posição em termos de produtividade, que, em 2011, ficou em torno de 1.555 litros/vaca/ano. Roraima é o estado com a menor produtividade nacional, cerca de 309 litros/vaca/ano.

Segundo o IBGE (2011), os municípios brasileiros com as maiores produtividades de leite produziram acima de 5.000 litros/vaca no ano de 2011, valor muito similar à média dos países europeus e dos Estados Unidos. Os principais municípios em produtividade leiteira estão localizados nos Estados de São Paulo, do

Paraná e do Rio Grande do Sul, os quais apresentam uma pecuária leiteira profissionalizada de alta tecnologia, com rebanho selecionado de aptidão leiteira, aliada a condições climáticas favoráveis (IBGE, 2011).

Conforme já citado, o Brasil apresenta grande variabilidade nos sistemas de produção. Assis, et al. (2005) apresenta uma classificação que define quatro tipos de sistemas de produção: extensivo, semi-extensivo, intensivo a pasto e intensivo em confinamento. Essa classificação foi feita com base no grau de intensificação e nível

de produtividade, caracterizados conforme alimentação volumosa adotada. A descrição sobre as diferenças entre esses quatro tipos de sistemas, conforme Assis,

et al. (2005) é apresentada a seguir: Sistema extensivo: Animais com produção de até 1.200 litros de leite por vaca ordenhada/ano, criados exclusivamente a pasto; Sistema semi-extensivo: Animais com produção entre 1.200 e 2.000 litros de leite por vaca ordenhada/ano, criados a pasto, com suplementação volumosa na época de menor crescimento do pasto;

Sistema intensivo a pasto: Animais com produção entre 2.000 e 4.500 litros

de leite por vaca ordenhada/ano, criados a pasto com forrageiras de alta capacidade

de suporte, com suplementação volumosa na época de menor crescimento do pasto ou, até mesmo, durante o ano todo; Sistema intensivo em confinamento: Animais com produção acima de 4.500 litros de leite por vaca ordenhada/ano, mantidos em confinamento e alimentados no cocho com forragens conservadas, como silagens e fenos.

Pohlmann (2000) afirma que no Brasil ainda predomina o manejo extensivo de criação de bovinos, no qual os animais ficam soltos no pasto e os dejetos espalhados pelo campo em grandes áreas. Porém, segundo o mesmo autor, há forte tendência de aumento das criações confinadas para os próximos anos.

2.2 Geração de resíduos pela atividade leiteira

Segundo Matos (2005), uma vaca leiteira com 400 Kg de peso médio produz

38 a 50 Kg de excretas diariamente, sendo deste total, 28 a 32 Kg de fezes e o restante, de urina. Contudo, na bovinocultura de leite, além dos resíduos gerados 38 a 50 Kg de excretas diariamente, sendo deste total, 28 a 32 Kg de fezes e o restante, de urina. Contudo, na bovinocultura de leite, além dos resíduos gerados

de resíduo líquido produzido em instalações de bovinocultura de leite depende do manejo adotado, de forma que o consumo de água pode variar de 40 a 600 litros por vaca ordenhada.

De acordo com Matos (2005), tanto a quantidade quanto as características das águas residuárias de criatórios de animais variam conforme a diluição proporcionada pela adição de água e também com o período do ano, dia da semana

e horário do dia. Mas, de forma geral, o autor afirma que a vazão de águas residuárias geradas é função do número de animais confinados, da quantidade de água desperdiçada nos bebedouros, da quantidade de água utilizada na higienização das instalações e transporte hidráulico dos dejetos e da existência ou não de sistemas de isolamento de águas pluviais.

Segundo Pohlmann (2000), o risco de impacto ambiental oriundo de criações

de gado de leite é maior do que o produzido por gado de corte, pois o gado de leite produz quantidade superior de dejetos, sendo que, mesmo em criações não confinadas, ocorre a retenção dos animais em estábulos para ordenha e lavagem dos equipamentos utilizados.

O Plano Nacional de Resíduos Sólidos - versão preliminar (BRASIL, 2011) apresenta um levantamento de dados acerca da situação atual de geração de resíduos agrosilvopastoris no Brasil, incluindo a geração de resíduos da atividade de bovinocultura de leite e o potencial de geração de energia dos mesmos. Os dados do diagnóstico são apresentados na tabela 2.

Tabela 2 – Geração de resíduos por bovinos de leite no Brasil, ano base 2009.

Número de cabeças de bovinos de leite

Total de dejetos (t/ano)

Potencial energético (MW/ano)

Fonte: Plano Nacional de Resíduos Sólidos (versão preliminar) (BRASIL, 2011).

Ainda segundo a versão preliminar do Plano Nacional de Resíduos Sólidos (BRASIL, 2011), o crescimento do setor agrosilvopastoril nos últimos anos indica que a geração de resíduos continuará aumentando e por isso, o manejo, o tratamento e a disposição desses resíduos deve ser adequado, pois estas atividades são extremamente dependentes do uso de recursos naturais.

2.3 Caracterização das águas residuárias de bovinocultura de leite

Águas residuárias provenientes de instalações de bovinocultura de leite são compostas principalmente por urina e esterco, como também detergentes oriundos

da limpeza da sala de ordenha, resíduos de leite e muco (HEALY, RODGERS e MULQUEEN, 2007). Além de sólidos e DBO, nutrientes como nitrogênio e fósforo são os constituintes mais importantes dessas águas residuárias, os quais são responsáveis pela eutrofização de corpos d´água (CRONK, 1996).

Segundo Derisio (1992) apud Campos (1997), a carga orgânica produzida por uma vaca é equivalente à carga orgânica produzida por 16 pessoas, considerando que no Brasil, uma pessoa elimina em média 54 g DBO 5 /dia (VON SPERLING, 2005). Já para Matos (2005), o equivalente populacional de uma vaca leiteira pode variar de 16 a 38 pessoas, dependendo da carga poluente da água residuária de bovinocultura leiteira.

Segundo Nennich, et al. (2005), o potencial nutricional dos dejetos de vacas em lactação os torna passíveis de tratamento e posterior reutilização, devido aos elevados teores de nutrientes, que são em torno de 0,491 Kg de nitrogênio por dia, 0,074 Kg de fósforo por dia e de 0,223 Kg de potássio por dia.

Quando o manejo dos dejetos é feito na fase líquida, os teores de contaminantes presentes na água residuária são normalmente expressos em mg/L. As águas residuárias provenientes de bovinocultura de leite apresentam concentrações de contaminantes mais elevadas se comparadas com esgoto doméstico, conforme é apresentado na tabela 3.

Contudo, Mantovi, et al. (2003) relata que é difícil caracterizar efluentes produzidos em sala de ordenha de bovinocultura, devido a ocorrência constante de variações no número de vacas ordenhadas, na quantidade de água e detergentes Contudo, Mantovi, et al. (2003) relata que é difícil caracterizar efluentes produzidos em sala de ordenha de bovinocultura, devido a ocorrência constante de variações no número de vacas ordenhadas, na quantidade de água e detergentes

de animais dependem da digestibilidade, composição da ração e da idade dos animais. Wood, et al. (2007) constataram um elevado desvio padrão na caracterização de efluentes produzidos em sala de ordenha, os autores justificaram essa variabilidade em função das práticas operacionais do local de pesquisa.

Tabela 3 - Comparação físico-química de efluentes produzidos em instalações de bovinocultura de leite e efluente doméstico, apresentados na literatura.

Tipo de efluente

N-NH 4 P Total SST

(mg/L)

(mg/L)

(mg/L)

(mg/L)

(mg/L) (mg/L)

Silva e Roston

Wood et al.

89,3 6.144 Efluente produzido em instalações de

Mumñoz, Drizo e bovinocultura

Hession (2006)

52 44 26 Newman et al.

15 921 Efluente doméstico

Dunne et al.

Von Sperling

Fonte: Pelissari, 2013.

2.4 Manejo dos resíduos de bovinocultura de leite

O manejo dos resíduos de bovinocultura leiteira varia de acordo com o sistema de produção adotado e com a consistência do resíduo (JOHANN, 2010). Segundo Matos (2005), a fim de facilitar o transporte e a aplicação dos resíduos em áreas de cultivo agrícola, a incorporação de água aos dejetos frescos, tem se tornado prática frequente em vários países, principalmente naqueles que utilizam tecnologias agropecuárias mais avançadas.

De acordo com a EMBRAPA (2004), para um determinado sistema de produção sempre há um sistema de manejo e tratamento mais adequado, sendo que o conteúdo de umidade do esterco determina parcialmente como ele pode ser manejado e armazenado. Segundo a classificação da EMBRAPA (2004), o esterco De acordo com a EMBRAPA (2004), para um determinado sistema de produção sempre há um sistema de manejo e tratamento mais adequado, sendo que o conteúdo de umidade do esterco determina parcialmente como ele pode ser manejado e armazenado. Segundo a classificação da EMBRAPA (2004), o esterco

Para a EMBRAPA (2004), existem várias formas para manejo do esterco, de acordo com a conveniência e o tipo de sistema de produção adotado, sendo: (i) Convencional ou manejo de esterco na forma sólida; (ii) Manejo de esterco líquido; (iii) Manejo de esterco semi-sólido ou misto; (iv) Manejo em lagoas de estabilização; (v) Compostagem; (vi) Combinações dos sistemas anteriores. Cada um desses sistemas descritos é composto pelas fases de coleta, armazenamento, tratamento, transporte e utilização. A seguir consta a descrição de como ocorre o manejo do esterco nas consistências sólido, semi-sólido e líquido, conforme a EMBRAPA (2004). Ressalta-se que o manejo de dejetos nos estados sólido e semi-sólido não faz parte do escopo do presente trabalho, por isso, será dado ênfase no manejo do esterco na forma líquida e nas respectivas possibilidades de tratamento.

Manejo do esterco na forma sólida ou convencional

Nessa forma de manejo, o esterco seco é raspado, manual ou mecanicamente, e amontoado para coleta e transporte. O esterco é retirado diariamente e pode ter diferentes destinos, podendo ser: (i) Armazenado em locais cobertos, ou não, para escoamento do excesso de umidade, e distribuído, em seguida, nas áreas de cultura; (ii) Levado para esterqueira ou para compostagem; (iii) Distribuído diretamente nas áreas de cultura.

É prática comum no Brasil, utilizar o esterco como fertilizante sem nenhum tipo de processamento ou tratamento prévio. Em sistemas de confinamento de bovinos leiteiros em baias coletivas, com utilização de camas, a opção mais econômica é a distribuição do esterco diretamente nas áreas de cultivo, onde a incorporação ao solo se dá por meio de aração ou gradagem.

Manejo do esterco semi-sólido ou misto

O manejo do esterco na forma semi-sólida ocorre quando a quantidade de água incorporada aos dejetos é apenas suficiente para facilitar a remoção do esterco das instalações de bovinocultura, resultando em uma mistura com 12% a 16% de sólidos totais, considerada muito úmida para o sistema convencional e pouco úmida para o sistema de irrigação. Nesse sistema de manejo, são utilizados tanques ou fossas de armazenamento para posterior fertirrigação dos solos. Normalmente, a distribuição do esterco semi-sólido necessita de um distribuidor de esterco líquido tracionado por trator ou de caminhão-tanque, equipado com sistema vácuo- compressor para as operações de homogeneização, carregamento e distribuição.

Manejo do esterco líquido

Para esse tipo de manejo, faz-se necessária a construção de tanques para coleta, tratamento e homogeneização do material proveniente da limpeza das instalações de bovinocultura. Os dejetos e os resíduos da alimentação são diluídos em água na proporção de 1:1 ou menos, de modo que a concentração de ST seja menor ou igual a 12%, a fim de permitir a utilização de sistemas de irrigação com equipamentos especiais. O volume dos tanques varia de acordo com o sistema de tratamento adotado, com o tamanho do rebanho, o sistema de confinamento, diluição dos dejetos, tempo de detenção hidráulica nos reatores biológicos, tipo de solo e culturas a serem irrigadas, manejo adotado para o sistema de irrigação (fertirrigação) e quantidade de chuva que o sistema pode suportar.

Entre as principais vantagens desse sistema estão a liberação de máquinas e equipamentos, como trator e implementos para outras atividades, baixa perda de nutrientes quando as irrigações são frequentes, economia de fertilizantes e corretivos convencionais, conservação e melhoramento da fertilidade do solo, possibilidade de reciclagem do esterco líquido tratado para limpeza hidráulica dos galpões de confinamento e economia de água, energia e mão-de-obra.

2.5 Principais métodos de tratamento de efluentes de bovinocultura

Os principais métodos para tratamento de efluentes agroindustriais são os sistemas anaeróbios (como os filtros anaeróbios e os reatores UASB), os sistemas

de lagoas de estabilização, os sistemas de lodos ativados e os sistemas wetlands construídos (MATOS, 2005; JOHANN, 2010). Para tratamento de águas residuárias

de bovinocultura de leite, existem diversas propostas publicados a nível internacional, destacando-se os trabalhos de Luostarinen e Rintala (2005), Dunne, et

al. (2005), Gottschall, et al. (2007), Bolan, et al. (2009), Ruane, et al. (2011), Rico, García e Rico (2011) e Comino, Riggio e Rosso (2012), os quais citam no geral, as lagoas de estabilização, os biodigestores, os filtros aeróbios, os reatores UASB e também os wetlands construídos como opções de tratamento desses efluentes. A seguir são descritos os principais métodos de tratamento apresentados na literatura.

2.5.1 Filtros anaeróbios

Os filtros anaeróbios são caracterizados por terem parte do volume preenchido com material inerte, onde ocorre imobilização da biomassa por aderência em meio suporte fixo, que permanece estacionário (CAMPOS, 1999). Segundo o mesmo autor, nesses reatores, o fluxo hidráulico ocorre nos interstícios do material suporte e o tratamento acontece pelo contato da biomassa com o esgoto, durante sua passagem pelo reator.

Em geral, os filtros anaeróbios são indicados para tratamento de águas residuárias caracterizadas por serem mais solúveis ou quando os sólidos orgânicos

de maiores dimensões forem retidos em uma unidade anterior, um decanto-digestor, por exemplo (CAMPOS, 1999). De acordo com Campos (1999), os filtros anaeróbios podem ser de fluxo ascendente ou descendente (figura 2). O filtro de fluxo ascendente é caracterizado por ter sempre o leito totalmente submerso. Por outro lado, o filtro de fluxo descendente pode ser operado com o meio suporte afogado ou não, e, além disso, com ou sem recirculação de efluente. Em ambos os tipos de filtros, o lodo de de maiores dimensões forem retidos em uma unidade anterior, um decanto-digestor, por exemplo (CAMPOS, 1999). De acordo com Campos (1999), os filtros anaeróbios podem ser de fluxo ascendente ou descendente (figura 2). O filtro de fluxo ascendente é caracterizado por ter sempre o leito totalmente submerso. Por outro lado, o filtro de fluxo descendente pode ser operado com o meio suporte afogado ou não, e, além disso, com ou sem recirculação de efluente. Em ambos os tipos de filtros, o lodo de

Segundo Matos (2005), os filtros anaeróbios quando utilizados para tratamento de efluentes agroindustriais, requerem unidades de decantação primária à montante (como fossas sépticas ou tanques de Imhoff) e lagoa facultativa como pós tratamento (figura 3). O emprego de uma lagoa facultativa objetiva melhor condicionar o efluente para lançamento nos corpos receptores, pois a remoção de DBO nos filtros anaeróbios é baixa, o efluente geralmente apresenta aspecto desagradável, concentração elevada de nutrientes, sólidos em suspensão e maus odores (MATOS, 2005).

Figura 2 – Configurações de filtros anaeróbios de fluxo ascendente e descendente.

Fonte: Campos, 1999.

Figura 3 – Esquema de sistema de tratamento com filtro anaeróbio, seguido de lagoa facultativa.

Fonte: Matos, 2005.

2.5.2 Reatores UASB

Os reatores UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket), também denominados

de RAFA (Reatores Anaeróbios de Fluxo Ascendente e de Manta de Lodo) são vistos por Von Sperling (2005) como a principal tendência atual de tratamento de esgotos no Brasil, tanto como unidades únicas ou seguidas de pós-tratamento. Nos reatores UASB a biomassa cresce dispersa no meio, formando pequenos grânulos, os quais tendem a servir de meio suporte para outras bactérias. Nesses reatores, a concentração de biomassa é bem elevada, o que justifica a denominação “manta de lodo”, por isso, o volume requerido pelos reatores UASB é bastante reduzido (VON SPERLING, 2005).

Segundo Campos (1999), o reator UASB possibilita o tratamento direto das águas residuárias, sejam elas de origem simples ou complexa, de baixa a alta concentração, solúveis ou com material particulado. O autor supõe que o UASB é ao mesmo tempo um decantador primário, um reator biológico, um decantador secundário e também um digestor de lodo.

O fluxo do líquido nos reatores UASB é ascendente, sendo que o líquido entra no fundo e se encontra com o leito de lodo, onde a matéria orgânica contida no esgoto é adsorvida pela biomassa. A parte superior desses reatores contém uma O fluxo do líquido nos reatores UASB é ascendente, sendo que o líquido entra no fundo e se encontra com o leito de lodo, onde a matéria orgânica contida no esgoto é adsorvida pela biomassa. A parte superior desses reatores contém uma

Figura 4 – Representação esquemática de um reator UASB.

Fonte: Campos, 1999 .

De acordo com Matos (2005), a utilização de efluente de UASB na fertirrigação é uma boa opção para efluentes agroindustriais, mas para o caso de lançamento em corpos hídricos, o efluente de UASB necessita de um pós tratamento, que pode ser obtido em uma lagoa facultativa (figura 5), por escoamento superficial no solo ou em unidades wetlands construídos.

UASB

Figura 5 – Esquema de sistema de tratamento com reator UASB seguido de lagoa facultativa.

Fonte: Matos, 2005.

2.5.3 Biodigestores

Um biodigestor pode ser definido como uma câmara fechada, na qual uma biomassa (em geral, resíduos de animais) é fermentada anaerobicamente, produzindo biogás e biofertilizante (GASPAR, 2003). Segundo Neves (2010), existem vários modelos de biodigestores, porém o mais difundido no Brasil é o modelo canadense, feito com manta de PVC (figura 6).

A digestão anaeróbica de esterco de gado leiteiro tem demonstrado ser uma forma atrativa de tratamento, oferecendo diversas vantagens, como controle da poluição, de odores, redução de patógenos, recuperação de nutrientes e produção

de energia (AMON, et al., 2007; HARTMANN e AHRING, 2005; KARIM, et al., 2005; UMETSU, et al., 2006 apud RICO, GARCÍA e RICO, 2011).

Figura 6 – Fotografia de um biodigestor do tipo canadense.

Fonte: Neves, 2010.

2.5.4 Filtros biológicos percoladores

Os filtros biológicos percoladores são reatores nos quais a biomassa cresce aderida a um meio suporte (como pedras, brita, escória de alto-forno, ripas ou material plástico), sobre o qual é aplicado o esgoto (frequentemente através de distribuidores rotativos), que percola em direção ao fundo, onde é coletado (figura 7) (VON SPERLING, 2005).

Segundo Von Sperling (2005), os filtros biológicos são sistemas aeróbios, pois o ar circula nos espaços vazios do meio suporte, fornecendo oxigênio para a respiração dos micro-organismos. Existem dois tipos de filtros biológicos percoladores: (i) Filtros biológicos percoladores de baixa carga – recebem menor carga de DBO, resultando numa estabilização parcial do lodo e numa maior eficiência na remoção de DBO; (ii) Filtros biológicos percoladores de alta carga – recebem uma maior carga de DBO por unidade de volume do filtro, por isso, os requisitos de área são menores se comparados aos filtros de baixa carga, há também, uma ligeira redução na eficiência de remoção de DBO e não ocorre digestão do lodo no filtro.

Figura 7 – Esquema de um filtro biológico percolador.

Fonte: Von Sperling, 2005.

2.5.5 Lodos ativados

Os sistemas de Lodos Ativados têm como princípio básico a recirculação dos sólidos (biomassa bacteriana), sedimentados em um decantador secundário, os quais retornam ao reator, aumentando o tempo de contato das bactérias com o líquido o que consequentemente, aumenta a eficiência do sistema (MATOS, 2005).

Existem diversas variantes do sistema de lodos ativados. Von Sperling (2005) destaca que as principais variantes são: (i) Lodos ativados convencional (fluxo contínuo) (figura 8); (ii) Aeração prolongada (fluxo contínuo) – a biomassa permanece maior tempo no reator e em decorrência, o lodo é estabilizado; (iii) Reatores sequenciais por batelada (operação intermitente) – as etapas de reação e sedimentação ocorrem no mesmo tanque, em fases diferentes. Segundo Matos (2005), o lodo produzido em sistemas de Lodos Ativados deve ser periodicamente removido e estabilizado antes de sua disposição final no meio ambiente.

De acordo com Matos (2005), os Lodos Ativados apresentam como vantagens: a elevada eficiência na remoção de DBO, possibilidade de remoção de N

e P, baixos requisitos de área, além de reduzidas possibilidades de geração de maus odores e desenvolvimento de insetos e vermes. Já entre as principais desvantagens estão os elevados custos de implantação e operação, o alto consumo

de energia elétrica, a necessidade de conhecimento técnico para operação, grande de energia elétrica, a necessidade de conhecimento técnico para operação, grande

Figura 8 – Fluxograma típico de um sistema de lodos ativados convencional.

Fonte: Adaptado de Von Sperling, 2005.

2.5.6 Lagoas de estabilização

As lagoas de estabilização são unidades projetadas para tratar águas residuárias por mecanismos predominantemente biológicos. De acordo com Von Sperling (2005), as lagoas de estabilização podem ser classificadas em: Lagoas facultativas, sistemas de lagoas anaeróbias seguidas de lagoas facultativas, lagoas aeradas facultativas, sistemas de lagoas aeradas de mistura completa seguidas de lagoas de sedimentação, lagoas de alta taxa, lagoas de maturação e lagoas de polimento. A escolha entre as diversas configurações de tratamento citadas depende

da disponibilidade de área junto à fonte geradora da água residuária, da taxa de geração, da velocidade exigida no tratamento e da localização (distância de áreas residenciais) (MATOS, 2005).

As lagoas de estabilização, notadamente as lagoas facultativas, as lagoas aeradas e os sistemas de lagoas anaeróbias seguidas de lagoas facultativas, têm sido muito utilizadas para tratamento de águas residuárias ricas em matéria orgânica, sendo muito adequadas no caso das agroindustriais (MATOS, 2005).

São muitas as vantagens das lagoas de estabilização, entre as principais estão a satisfatória eficiência na remoção de DBO, razoável eficiência na remoção

de patógenos, construção, operação e manutenção simples e os reduzidos custos

de implantação e operação. Entre as principais desvantagens desse tipo de sistema pode-se citar os elevados requisitos de área, possibilidade de geração de maus odores (no caso de lagoa anaeróbia), necessidade de afastamento de residências e

a performance extremamente dependente das condições climáticas. Na figura 9 são apresentadas as configurações mais frequentes de lagoas de estabilização aplicadas ao tratamento de águas residuárias agroindustriais, as quais são descritas por Matos (2005).

Figura 9 – Sistemas de lagoas de estabilização: a) Sistema com lagoa facultativa; b) Sistema com lagoa anaeróbia seguida de lagoa facultativa; c) Sistema com lagoa aerada de mistura completa seguida de unidade de decantação.

Fonte: Adaptado de Matos, 2005.

2.5.7 Disposição no solo

A disposição de águas residuárias agroindustriais no solo é uma técnica atraente para a realidade brasileira, devido às condições de clima tropical e à grande disponibilidade de área. Esta técnica se baseia na capacidade depuradora do sistema solo-planta, que utiliza mecanismos físicos, químicos e biológicos de remoção dos poluentes contidos nas águas residuárias (ERTHAL, 2010a).

De acordo com Matos (2005), a disposição de efluentes no solo é uma técnica

de tratamento de grande potencial de aplicação, em vista dos baixos custos de implantação e operação, por contribuir para a preservação do meio ambiente, por possibilitar o aproveitamento dos nutrientes contidos na água residuária para a produção agrícola, e também, devido à possibilidade de transformação dos resíduos gerados em fonte de renda ou benefício social.

Essa técnica tem mostrado grande viabilidade técnica e econômica, podendo ser uma forma de tratamento, tanto a nível primário, quanto a nível secundário ou terciário e/ou de disposição final (MATOS, 2005). Contudo, segundo o mesmo autor, para disposição de águas residuárias agroindustriais no solo, são necessários estudos que visem a definição de taxas de aplicação (considerando as capacidades

de suporte de cada solo) e que resguardem a integridade dos recursos naturais, a fim de evitar problemas de qualidade ambiental. De acordo com Matos (2005), as formas de disposição podem ser infiltração- percolação, escoamento superficial, fertirrigação e lançamento em “áreas alagadas” (wetlands construídos). No presente trabalho, no entanto, preferiu-se por abordar separadamente os wetlands construídos (ítem 2.5.8), de acordo com os objetivos pré-estabelecidos.

O sistema de infiltração-percolação, também chamado de infiltração rápida, é caracterizado pela percolação da água residuária, a qual é filtrada na passagem pelo solo e constitui recarga para águas freáticas ou subterrâneas (MATOS, 2005). De acordo com Matos (2005), nesse sistema, o efluente é disposto de forma intermitente com altas taxas de aplicação (baixas perdas por evaporação) em bacias rasas ou valas de infiltração construídas em solos de alta permeabilidade (figura 10).

Figura 10 – Esquema de sistema de infiltração-percolação, em canais de infiltração.

Fonte: Matos, 2005.

O método de escoamento superficial é uma forma de disposição/tratamento que consiste na aplicação controlada e de forma intermitente de águas residuárias no solo, de forma que essas escoem, rampa abaixo, até alcançar canais de coleta (figura 11) (VON SPERLING, 2005). Segundo Von Sperling (2005), os solos indicados para esse tipo de tratamento/disposição final são os de baixa permeabilidade (como os argilosos), contendo uma inclinação moderada (entre 2 e 8%).

Figura 11 – Esquema de sistema de tratamento por escoamento superficial.

Fonte: Matos, 2005.

Já a fertirrigação (figura 12), diferentemente dos métodos mencionados anteriormente, é uma técnica de disposição/tratamento onde prioriza-se o aproveitamento dos nutrientes contidos nas águas residuárias. Para isso, as taxas

de aplicação de águas residuárias agroindustriais no solo devem ser baseadas na dose de nutrientes recomendadas para as culturas agrícolas (MATOS, 2005).

Figura 12 – Esquema da técnica da fertirrigação de culturas agrícolas (infiltração lenta).

Fonte: Matos, 2005.

2.5.8 Wetlands construídos

Os wetlands construídos são sistemas de tratamento de águas residuárias projetados para “imitar” o papel de depuração que naturalmente ocorre em ambientes alagados naturais (como brejos e pântanos). De forma geral, são lagoas ou canais rasos que abrigam plantas aquáticas e que baseiam-se em mecanismos físicos, químicos e biológicos para tratar águas residuárias.

Existem várias configurações de wetlands construídos. A figura 13 apresenta uma classificação dos wetlands construídos em dois grandes grupos: (i) de escoamento superficial; (ii) de escoamento subsuperficial. Porém, nesse estudo, serão abordados apenas os wetlands de escoamento subsuperficial.

Os wetlands construídos de escoamento subsuperficial são módulos normalmente escavados no terreno, que contém um material de recheio (brita, areia ou cascalho) no qual o efluente a ser tratado percola, dependendo do tipo de fluxo empregado, no sentido horizontal (wetlands construídos de fluxo horizontal – WCFH) ou vertical (wetlands construídos de fluxo vertical – WCFV).

Figura 13 – Classificação dos wetlands construídos.

Fonte: Adaptado de Vymazal e Kroepfelová, 2008.

Wetlands construídos de fluxo horizontal (WCFH)

Nos WCFH (figura 14) o efluente é disposto em uma camada de brita, denominada zona de entrada, percola pelo material filtrante, geralmente areia, até atingir a porção final do filtro, também composta por brita, devido a uma declividade

de fundo. Os WCFH apresentam-se como sistemas eficientes na remoção de sólidos suspensos, matéria orgânica carbonácea (DBO 5,20 ), e nitrogenada - desde que o sistema receba efluente parcialmente nitrificado (COOPER, et al., 1996).

Figura 14 – Esquema representando um WCFH. 1) afluente; 2) macrófitas; 3) impermeabilização; 4) zona de entrada; 5) tubulação de alimentação; 6) material filtrante; 7) sentido do fluxo; 8) zona de saída; 9) tubulação de coleta; 10) controlador

de nível.

Fonte: Pelissari, 2013.

Wetlands construídos de fluxo vertical (WCFV)

Nos WCFV (figura 15) o efluente a ser tratado é disposto intermitentemente, sobre a superfície do módulo de tratamento, e percola verticalmente ao longo de todo o perfil vertical, sendo coletado no fundo por meio de um sistema de drenagem/coleta (PHILIPPI e SEZERINO, 2004). Os WCFV, assim como os WCFH, também são eficientes na remoção de matéria orgânica carbonácea e sólidos suspensos, mas diferem destes por apresentar configuração que favorece a conversão de matéria orgânica nitrogenada por nitrificação (IWA, 2000; PHILIPPI e SEZERINO, 2004; KAYSER e KUNST, 2005).

Figura 15 - Esquema representando um WCFV. 1) afluente; 2) macrófitas; 3) material filtrante; 4) tubulação de alimentação; 5) sentido do fluxo; 6) tubulação de coleta; 7) impermeabilização; 8) controlador de nível; 9) efluente.

Fonte: Pelissari, 2013.

3 TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS DE BOVINOCULTURA DE LEITE NO BRASIL – ESTADO DA ARTE

3.1 Introdução

A bovinocultura de leite é uma atividade de grande importância econômica para o Brasil. Em 2011, a produção total de leite registrada pela Pesquisa da Pecuária Municipal do IBGE foi de 32,091 bilhões de litros (IBGE, 2011). Essa produção ocorre em praticamente todo território nacional e apresenta forte tendência

de crescimento para os próximos anos. Contudo, a expansão da bovinocultura de leite no país, exige o desenvolvimento de tecnologias que possibilitem a mitigação do impacto ambiental gerado na atividade, que pode causar poluição do ar, do solo e dos recursos hídricos. As águas residuárias de bovinocultura de leite, segundo Rico, García e Rico (2011), estão entre as águas residuárias agroindustriais mais poluentes, pois fazendas de gado leiteiro produzem efluentes com altas concentrações de matéria orgânica, nitrogênio e fósforo, que quando mal gerenciados podem causar graves problemas ambientais.

Diversas propostas para tratamento de águas residuárias de bovinocultura de leite são apresentadas em trabalhos publicados a nível internacional, destacando-se os trabalhos de Luostarinen e Rintala (2005), Dunne, et al. (2005), Gottschall, et al. (2007), Bolan, et al. (2009), Ruane, et al. (2011), Rico, García e Rico (2011) e Comino, Riggio e Rosso (2012). Contudo, pouco conhecimento se tem sobre as tecnologias já implantadas para tratamento desse tipo de água residuária no Brasil e principalmente, sobre as experiências bem sucedidas. É importante destacar que o tratamento dessas águas residuárias deve ser adequado tanto à forma de produção, quanto à legislação ambiental vigente nos estados produtores de leite do país.

Diante do exposto, o principal objetivo deste capítulo é apresentar uma revisão de literatura sobre as alternativas propostas e as experiências bem sucedidas no Brasil para tratamento de efluentes de bovinocultura de leite, a fim de possibilitar a disseminação dessas tecnologias, melhorando a qualidade ambiental.

3.2 Metodologia

A metodologia empregada consistiu na busca de textos científicos nacionais publicados em diversas bases de dados a partir do ano 2000, tomando-se como base de busca por assunto as palavras-chave: bovinocultura de leite, tratamento de efluentes e tratamento de dejetos.

Inicialmente, cada texto foi submetido a uma primeira etapa de consulta com o objetivo de identificar as tecnologias utilizadas para tratamento de águas residuárias de bovinocultura de leite.

Após esta primeira etapa, os textos foram submetidos a uma segunda etapa

de avaliação, buscando identificar aspectos gerais de cada trabalho, com ênfase na caracterização qualitativa da água residuária bruta, tratada e as respectivas eficiências obtidas no tratamento. Para tanto, buscou-se identificar parâmetros físico-químicos, e biológicos, tais como: DBO, DQO, pH, nitrogênio, fósforo, Coliformes fecais, E. coli, sólidos, óleos e graxas e turbidez.

3.3 Resultados e discussão

Na tabela 4 constam as bases de dados onde foram encontrados trabalhos relacionados ao tratamento de efluentes de bovinocultura de leite no Brasil, bem como os autores e a quantidade de trabalhos disponível.

Também foi pesquisado em outras fontes, mas sem nenhuma ocorrência, as quais foram: Revista de Engenharia Sanitária e Ambiental, Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental e Revista Ambiente e Água, além de Congressos, Seminários e Simpósios relacionados.