3. Normas de conduta, normas de estrutura e sanções
A idéia de que há certos agentes produtores de textos normativos parece evidenciar que além das normas ditas de “conduta” deve haver normas que
habilitam ou que deferem esse poder de elaborar normas jurídicas a certas pessoas. Portanto, caso sejam consideradas as referências normativas que
específica ordem jurídica pode apresentar, afigura-se claro que nem todas cumprem a função de servirem de pautas para as condutas humanas. De tão
importante é esta percepção que, de uma anterior compreensão da juridicidade centrada em critérios essencialistas ser a norma sancionadora negativa, por
exemplo, como fez K
ELSEN
, atualmente grande espaço é reservado para as análises dos critérios de existência-pertencimento que a norma N tenha sido
produzida pela autoridade normativa AN da ordem jurídica OJ no tempo t para o âmbito espacial q.
Grosso modo, as normas de uma ordem jurídica ou bem são normas de conduta ou primárias, ou bem são normas de estrutura ou secundárias. As
“normas de conduta” correspondem aos comandos de comportamento, i.e., aos preceitos que geram obrigações, proibições e autorizações ou permissões. São
normas, por assim dizer, que instituem o “obrigatório” Op, o “proibido” Php, e o “permitido” Pp. Estar “obrigado”, ser “proibido”, e ter a “permissão” são
determinações para as condutas humanas ou, como também se usa dizer: são modais deônticos. Essas determinações cumprem a função, não apenas de
formarem marcos com vistas a obter comportamentos conformes, mas também são padrões avaliativos concretos para os atos disformes. Já as normas de
estrutura formam um grupo muito variado de normas, tais como as normas de racionalização da produção normas de produção jurídica, interpretação dos
textos normativos, de aplicação das normas, de revogação de textos normativos e de normas, etc.
Às normas de conduta comumente são agregadas sanções jurídicas. Para a cultura jurídica tradicional, “sanção” é o ato de força pelo qual o Estado, fazendo
uso de seu monopólio da violência regulada, castiga os sujeitos que tenham realizado uma conduta prevista como ilícita por uma norma jurídica. Contudo, duas
oposições, ao menos, podem ser feitas a essa forma de concebê-la: uma, ontológica; outra, metodológica. A primeira oposição ― oposição ontológica ―
assenta-se no valor atribuído à sanção. Segundo essa corrente doutrinária, a sanção não é essencial às normas jurídicas porque nem todas as normas que
comumente são consideradas jurídicas pelos teóricos do direito são normas dotadas de sanção. Com efeito, afirmam os autores que assumem essa postura
que o modelo sancionador além de rígido é inconsistente. Pense-se nas definições legislativas, nas normas de competência, nas normas que estabelecem
procedimentos, todas elas afrontam o modelo canônico das normas sancionadoras, e chamá-las de normas não-autênticas, de fragmentos de normas,
ou mesmo de normas não-autônomas, pouco esclarece o papel que desempenham nas ordens jurídicas. A segunda oposição ― oposição
metodológica ― tem por base outra estratégia; porque embora os teóricos que assumem essa corrente não neguem de modo definitivo o critério da sanção,
ponderam que a técnica da sanção como punição não é a única técnica utilizada funcionalmente pelo direito para reforçar o cumprimento das normas de conduta,
i.e., nem todas as sanções presentes nos ordenamentos jurídicos são sanções negativas. Porque dizer que as sanções correspondem a certa técnica que as
ordens normativas dispõem para reforçar a observância e prevenir a inobservância de suas próprias normas, não é o mesmo que dizer que esse reforço deve ser
necessariamente uma resposta negativa ou que implique em um prejuízo ao praticante da falta ou seu responsável, pois com freqüência as ordens jurídicas
contemporâneas fazem uso das sanções positivas ou promocionais Bobbio, 1977. Com isso, se é comum se pensar em um mal que se põe como resposta a
uma proibição que é violada, pode-se bem utilizar, noutro sentido, a técnica de beneficiar àquele que age conforme ao preceituado, e esta é a essência das
sanções positivas. Tudo com vistas a manter a utilização concreta da ordem jurídica com o fim de se evitar que ela mesma desapareça por falta de
repercussão fática. Nesses termos, considerando o critério do pertencimento- existência, todo material jurídico produzido por um agente competente, possua ou
não sanção de qualquer tipo, é material que existe na ordem jurídica.
4. Composição formal das normas jurídicas